16/04/2020
Por Henrique Cisman
Os empresários acompanham com esperança as ações do Ministério da Economia para salvar negócios e empregos no atual momento. Ao lado do Poder Executivo, a Caixa tem anunciado medidas que atendem o mercado imobiliário, mas um movimento parecido ainda é tímido nos demais bancos.
“O banco prefere não tomar risco em emprestar dinheiro e, eventualmente, no entendimento dele, ficar desguarnecido, emprestar para quem eles acham que não pode pagar. Portanto, o governo está carimbando o dinheiro e dizendo que a responsabilidade de um eventual default é dele”, explica o administrador João Sampaio Vianna, fundador e presidente da Ipanema Investimentos.
Pareado à realidade, o mercado imobiliário tem encontrado outras formas de tomar recursos, seja para financiar a produção como para se desfazer da dívida com os bancos após a conclusão da obra. Rafael Andrade, vice-presidente comercial da Captalys Real Estate, afirma que um dos produtos da gestora tem sido bastante procurado nesse momento de crise, na qual emerge o cenário de iliquidez.
A operação, chamada Giro de Estoque, consiste na liberação de até 60% do valor das unidades não vendidas para que as incorporadoras quitem os débitos bancários (alonguem seus eventuais passivos de obra) ou utilizem os recursos para capital de giro (se o financiamento bancário já foi pago). “O prazo é maior – até 36 meses – e outro diferencial é o pagamento somente quando se comercializa a unidade. Não existe pagamento de juros mensais nem parcela de amortização periódica”, explica Andrade.
Com recursos oriundos de fundos geridos pela Captalys, o Giro de Estoque é aderente ao momento atual: “Não é um produto novo, mas o mercado é cíclico e os problemas se repetem. Ajustamos, por exemplo, o percentual-limite da operação de 50% para 60% e incluímos estoque de unidades comerciais”, afirma o VP comercial da gestora.
Devido à crise, o presidente da Ipanema Investimentos revela que o lançamento do FII (fundo de investimento imobiliário) da empresa foi suspenso, mas uma nova solução de investimento imobiliário será lançada em maio, segundo o executivo. “Vamos continuar captando e investindo. É uma alternativa para tempos de crise”, diz Vianna, sem revelar mais detalhes da operação.
Amplamente conhecido para arrecadações coletivas, o crowdfunding é outra alternativa para investimento e financiamento imobiliário. “A procura tem sido maior. O crowdfunding é um pouco antigo, mas não para a cabeça do incorporador. Hoje, é mais uma opção para esse mercado, uma alternativa de peer-to-peer na qual o credor é o investidor e o devedor é o tomador do crédito”, afirma Alex Silva, fundador da Swiss Consultoria em Investimento Coletivo.
Segundo Silva, a empresa nasceu justamente da percepção de que os incorporadores têm muitas dúvidas sobre como captar recursos via crowdfunding: “Recebemos, em média, de 100 a 150 executivos por mês interessados nesse modelo. Algumas plataformas são muito exigentes, outras, mais maleáveis. Levamos o cliente para a plataforma que mais se encaixa ao perfil da empresa dele”.
Cenário favorece mercado de capitais
Na avaliação de Rafael Andrade, embora a Caixa tenha sido bastante responsável, ainda é cedo para entender a efetividade das medidas anunciadas: “A dificuldade é na concessão de novas operações de crédito; linhas que antes estavam disponíveis e aprovadas, deixaram de estar por conta das incertezas do mercado. A procura [pelo mercado de capitais] está maior”, afirma.
Para João Sampaio Vianna, “os bancos, em um movimento de proteção, represam toda sorte de crédito e cedem espaço para alternativas não existentes ou que eram insuficientes”. Ele entende que haverá cada vez mais alternativas no mercado de capitais ao financiamento bancário. “Independente de crise, é uma tendência irreversível”.
Já o consultor Alex Silva salienta que as operações de crowdfunding são mais dinâmicas, menos burocráticas e contam com engajamento do financiador (os investidores, geralmente pessoas físicas). “Os incorporadores estão acostumados com os bancos, que trazem receita pronta e o tomador tem que aceitá-la. No crowdfunding, o cliente tem total liberdade para fazer o pagamento no prazo estipulado”.
Rafael Andrade, VP comercial da Captalys, destaca que há cada vez menos espaço para a intermediação realizada pelos bancos: “O setor tem atravessado o caminho da desintermediação, é a forma mais eficiente para conectar o tomador de recursos com o investidor”.
O presidente da Ipanema Investimentos, João Sampaio Vianna, ressalta que a Selic é o fator-chave da mudança de cenário: “Diferente do que foi feito no passado, a Selic tende a se manter em patamares baixos por muito mais tempo, não pela força da caneta, mas porque as condições permitem. Se fizer a conta do rendimento real, tirando a inflação do período, vai ganhar 0,20% ao ano [na renda fixa]”.
Segundo Vianna, haverá migração maciça de investimentos para a Bolsa de Valores, aos FIIs e a outros instrumentos de ativos reais: “As pessoas vão ter que parar com a ideia de rentismo, no sentido de comprar CDI, títulos do Tesouro etc., e ir para a vida real. Todos estão fazendo o mesmo movimento, não porque querem, mas por imposição da realidade”.